Pesquisa FAPESP -Maria Guimarães
Edição Impressa 156 - Fevereiro
Depois da menopausa, quando acabam as ovulações mensais e os teores de hormônios femininos caem bastante, a qualidade da vida sexual de mais de um terço das mulheres piora muito. Elas passam a evitar relações sexuais, em grande parte por sentir desconforto e dor que tornam o sexo quase um suplício doloroso. Essas constatações vêm de um levantamento coordenado pelo ginecologista Aarão Mendes Pinto-Neto, da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e detalhado em três artigos publicados em 2008 na revista Menopause.
No trabalho, parte da tese de doutorado da ginecologista Ana Lúcia Valadares, os pesquisadores avaliaram a qualidade da vida sexual de 378 mulheres com idades entre 40 e 65 anos que haviam completado o ensino médio, uma população muito pouco estudada no Brasil. Todas as entrevistadas eram moradoras de Belo Horizonte, capital de Minas Gerais. Elas responderam a um questionário – desenvolvido na Austrália e traduzido para o português pelo grupo da Unicamp – que investiga a vida sexual por meio de perguntas sobre a frequência das relações sexuais (solitárias ou a dois, com ou sem penetração vaginal), a intensidade do prazer alcançado com o sexo e a frequência e a intensidade de pensamentos sobre sexo e do desejo sexual. Um dos resultados que chamaram a atenção foi a grande frequência de dor durante a penetração – distúrbio chamado pelos médicos de dispareunia –, mencionada por quase 40% das entrevistadas. “Entre dois e três anos depois da menopausa, quase todas as mulheres sentem algum nível de desconforto devido à secura vaginal”, conta Aarão. Em muitos casos, nada que informação e um pouco de gel lubrificante não resolvam. A companhia de um parceiro carinhoso e saudável também se mostrou indispensável para uma boa sexualidade. Ana verificou que as mulheres cujos parceiros tinham problemas como disfunção erétil ou ejaculação precoce apresentavam maior tendência a sentir dor durante o sexo. Uma explicação provável, segundo os pesquisadores, é que essas mulheres, para atingir um nível de lubrificação confortável, precisavam receber mais carícias, o que nem sempre um parceiro mais apressado consegue dar. A dispareunia foi mais comum entre as mulheres com depressão e as que se sentem nervosas em relação ao sexo. Como o questionário estabelece a correlação, mas não permite saber se a dor causa o problema emocional ou se é consequência dele, os pesquisadores se valem da experiência clínica para entender melhor os resultados. Com base nos casos que viu em mais de 20 anos de estudo, o ginecologista da Unicamp acredita que o desconforto físico surge antes do problema emocional. E, quando a mulher antecipa a dor que sentirá, começa a evitar a atividade sexual.Alguns dos sinais desagradáveis da menopausa atrapalham o sexo, o que torna a disfunção sexual mais comum entre as mulheres que têm esses sintomas. Não surpreende. Quem transpira e sente falta de ar durante ondas súbitas de calor, não produz lubrificação vaginal, sofre de insônia, tem depressão e passa por um período em que as oscilações de humor parecem uma montanha-russa a ponto de dar saudades das tensões pré-menstruais da juventude dificilmente encara o sexo com bons olhos. Além disso, os medicamentos contra depressão e hipertensão, problemas comuns nessa fase da vida, podem diminuir o desejo sexual.
Medida pessoal - Uma boa vida sexual, Aarão frisa, é a que satisfaz a própria pessoa. Há quem fique feliz com sexo uma vez ao mês e quem ache três vezes por semana pouco. E, ele acrescenta, o desejo sexual naturalmente diminui com a idade – não com a menopausa. “Um homem de 50 anos tem menos desejo do que tinha aos 20 anos; o mesmo acontece com as mulheres.” Por essa razão, o pesquisador não fala em sexualidade boa ou normal, mas sim adequada para cada mulher. A satisfação, porém, não depende apenas da saúde física. Para uma vida sexual plena, a saúde emocional do relacionamento deve estar em dia. “Para ter uma sexualidade adequada, a mulher precisa sentir atração pelo parceiro”, conta o pesquisador da Unicamp. O questionário incluiu perguntas sobre quão satisfeita a participante estava com seu parceiro como amante, se estava apaixonada e, de maneira geral, como se sentia em relação a ele – ou ela, no caso de relações homossexuais. Uma proporção maior (de 71% a 86%) de mulheres que deram nota máxima em uma escala de 0 a 6 para cada um desses três itens – ou seja, estavam apaixonadas, os parceiros as satisfaziam e elas os viam como bons companheiros – afirmou ter uma boa vida sexual. Entre as menos satisfeitas com seus parceiros, mais da metade (entre 53% e 56%) tinha a sexualidade prejudicada. Entre as mulheres da capital mineira, ficou claro que ter um parceiro sexual saudável é importante para uma boa vida sexual, mas morar com esse parceiro atrapalha. Segundo o ginecologista, alguns sexólogos defendem que a cura para a disfunção sexual feminina é um parceiro jovem e atraente. A partir desse levantamento, os ginecologistas podem ajudar as mulheres a resgatarem sua sexualidade depois da idade reprodutiva. Para isso é preciso avaliar o caso de cada paciente e buscar soluções mais adequadas para elas. A terapia de reposição hormonal, por exemplo, pode reduzir a falta de lubrificação e os calores, e determinadas posições sexuais podem ser mais confortáveis e prazerosas para a mulher. “Nossa função”, resume Aarão, “é oferecer bem-estar geral às mulheres e preservar a saúde delas para a velhice”.
Artigos científicos
1. VALADARES, A.L. et al. Sexuality in Brazilian women aged 40 to 65 years with 11 years or more of formal education: associated factors. Menopause. v. 15, n. 2, p. 264-269. mar.-abr. 2008.
2. VALADARES, A.L. et al. The sexuality of middle-aged women with a sexual partner: a population-based study. Menopause. v. 15, n. 2, p. 706-713. jul-ago. 2008.
3. VALADARES, A.L. et al. A population-based study of dyspareunia in a cohort of middle-aged Brazilian women. Menopause. v. 15, n. 6, p. 1.184-1.190. nov-dez. 2008
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