Por Fábio de Castro
Agência FAPESP
Qual é a extensão das modificações moleculares ocorridas no cérebro depois de quatro dias e quatro noites sem dormir? E até que ponto um descanso de 24 horas pode reverter essas mudanças? Essas questões foram abordadas por um estudo feito na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) com o objetivo de investigar as bases biológicas dos distúrbios de sono.
De acordo com o estudo, ratos privados por 96 horas do sono REM – fase que ocorre, em humanos, predominantemente na segunda metade da noite e que cientistas acreditam estar relacionada às funções cognitivas como atenção e memória, entre outras funções – apresentaram modificações em apenas 78 genes transcritos. Depois de 24 horas de descanso, 62% dos genes tiveram sua expressão normalizada. O estudo foi publicado na revista Behaviourial Brain Research.
A pesquisa foi feita no Instituto do Sono, um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) da FAPESP. Os autores do artigo foram Camila Guindalini, Monica Andersen, Tathiana Alvarenga, Kil Sun Lee e o coordenador do instituto, Sergio Tufik.
De acordo com Camila, primeira autora do artigo, dentre os muitos estudos coordenados por Tufik nos últimos 30 anos, vários foram feitos com o modelo experimental específico baseado na privação de sono REM por 96 horas.
“Esse modelo gerou muita informação sobre a reação dos animais em termos de comportamento, capacidade de atenção, modificações hormonais e dados neuroquímicos, por exemplo. Os resultados desse novo estudo mostram que, com os métodos utilizados, poderemos a partir de agora inserir dados moleculares nesse conjunto, o que ajudará a explicar melhor os fenômenos”, disse à Agência FAPESP.
Segundo Camila, o córtex cerebral dos animais foi analisado em microarrays – lâminas preparadas com arranjo de fragmentos de RNA – e os dados foram validados com a técnica de reação de polimerase em cadeia em tempo real (RT-qPCR, na sigla em inglês).
“Essa técnica nos permitiu avaliar os genes de uma maneira global. Isto é, em vez de observar um gene específico, pudemos examinar como o conjunto se comporta depois de uma manipulação. Assim, avaliamos a expressão gênica global relacionada à privação de sono”, disse.
A observação global das modificações genéticas, segundo Camila, é importante por permitir avaliar as interações entre os diferentes genes. “Com isso, em vez de partir de uma hipótese específica, pudemos trabalhar com todo o sistema”, disse.
Camila explica que estudos anteriores já haviam demonstrado que algumas das alterações biológicas causadas pela privação de sono REM não são completamente revertidas depois de um período de rebote de sono – termo utilizado para indicar o fenômeno de um sono mais intenso após um período de privação.
“Sabemos que depois de 96 horas de privação de sono REM o animal não pode voltar à situação normal após o rebote. Ele pode demorar até dez dias para recuperar as condições anteriores. Um outro trabalho, por exemplo, mostrava que fêmeas privadas do sono por 96 horas, durante uma fase específica do ciclo estral, tinham o ciclo interrompido por dez dias”, afirmou.
Segundo a cientista, foi verificado que apenas 78 genes transcritos estavam alterados depois da privação de sono REM por 96 horas – incluindo genes relacionados a processos metabólicos, ritmo biológico (controle do período de sono e vigília), resposta a estímulos e regulação de proliferação celular.
“Achávamos que uma privação dessa magnitude iria gerar uma modificação maior, já que o genoma tem cerca de 25 mil genes. Mas, sabendo que havia essas alterações, a pergunta passou a ser: quantos desses genes voltam ao normal depois do rebote de sono?”, disse. Base molecular
O estudo mostrou que 62% dos genes voltavam ao normal após 24 horas e o restante apresentava níveis intermediários de expressão. “Uma hipótese que levantamos a partir daí é que pode haver necessidade de mais tempo para a recuperação total, já que, quando o animal é submetido à eutanásia para fazer a análise, o que se tem é um retrato da expressão dos genes naquele momento”, disse Camila.
Para manter os animais privados do sono REM, segundo a pesquisadora, o método consiste em mantê-los em uma pequena plataforma onde precisam se equilibrar para não cair em um recipiente com água. Na fase REM do sono, explicou, os animais entram em atonia muscular – isto é, não se sustentam em seus músculos – e caem na água.
Esse tipo de modelo experimental foi aplicado a humanos também, segundo Camila. “Temos estudos nos quais monitoramos, por polissonografia, pessoas privadas do sono REM durante 96 horas. Também estudamos pessoas sob privação total de sono durante 48 horas.”
Olhando a expressão gênica de maneira global, o novo trabalho mostrou que as alterações verificadas nos animais após a privação de sono REM têm uma base molecular no cérebro. Com isso, os dados obtidos forneceram um conjunto de transcritos que podem estar relacionados à regulação do sono REM e à base biológica de distúrbios do sono.
“A partir de agora vamos estudar as alterações em outras áreas do cérebro além do córtex. O ponto principal é que mostramos que o método é eficaz para inserir a parte molecular em todos os outros modelos, possibilitando uma visão mais detalhada e basal”, disse.
O artigo To what extent is sleep rebound effective in reversing the effects of paradoxical sleep deprivation on gene expression in the brain?, de Camila Guindalini e outros, pode ser lido em www.sono.org.br
De acordo com o estudo, ratos privados por 96 horas do sono REM – fase que ocorre, em humanos, predominantemente na segunda metade da noite e que cientistas acreditam estar relacionada às funções cognitivas como atenção e memória, entre outras funções – apresentaram modificações em apenas 78 genes transcritos. Depois de 24 horas de descanso, 62% dos genes tiveram sua expressão normalizada. O estudo foi publicado na revista Behaviourial Brain Research.
A pesquisa foi feita no Instituto do Sono, um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) da FAPESP. Os autores do artigo foram Camila Guindalini, Monica Andersen, Tathiana Alvarenga, Kil Sun Lee e o coordenador do instituto, Sergio Tufik.
De acordo com Camila, primeira autora do artigo, dentre os muitos estudos coordenados por Tufik nos últimos 30 anos, vários foram feitos com o modelo experimental específico baseado na privação de sono REM por 96 horas.
“Esse modelo gerou muita informação sobre a reação dos animais em termos de comportamento, capacidade de atenção, modificações hormonais e dados neuroquímicos, por exemplo. Os resultados desse novo estudo mostram que, com os métodos utilizados, poderemos a partir de agora inserir dados moleculares nesse conjunto, o que ajudará a explicar melhor os fenômenos”, disse à Agência FAPESP.
Segundo Camila, o córtex cerebral dos animais foi analisado em microarrays – lâminas preparadas com arranjo de fragmentos de RNA – e os dados foram validados com a técnica de reação de polimerase em cadeia em tempo real (RT-qPCR, na sigla em inglês).
“Essa técnica nos permitiu avaliar os genes de uma maneira global. Isto é, em vez de observar um gene específico, pudemos examinar como o conjunto se comporta depois de uma manipulação. Assim, avaliamos a expressão gênica global relacionada à privação de sono”, disse.
A observação global das modificações genéticas, segundo Camila, é importante por permitir avaliar as interações entre os diferentes genes. “Com isso, em vez de partir de uma hipótese específica, pudemos trabalhar com todo o sistema”, disse.
Camila explica que estudos anteriores já haviam demonstrado que algumas das alterações biológicas causadas pela privação de sono REM não são completamente revertidas depois de um período de rebote de sono – termo utilizado para indicar o fenômeno de um sono mais intenso após um período de privação.
“Sabemos que depois de 96 horas de privação de sono REM o animal não pode voltar à situação normal após o rebote. Ele pode demorar até dez dias para recuperar as condições anteriores. Um outro trabalho, por exemplo, mostrava que fêmeas privadas do sono por 96 horas, durante uma fase específica do ciclo estral, tinham o ciclo interrompido por dez dias”, afirmou.
Segundo a cientista, foi verificado que apenas 78 genes transcritos estavam alterados depois da privação de sono REM por 96 horas – incluindo genes relacionados a processos metabólicos, ritmo biológico (controle do período de sono e vigília), resposta a estímulos e regulação de proliferação celular.
“Achávamos que uma privação dessa magnitude iria gerar uma modificação maior, já que o genoma tem cerca de 25 mil genes. Mas, sabendo que havia essas alterações, a pergunta passou a ser: quantos desses genes voltam ao normal depois do rebote de sono?”, disse. Base molecular
O estudo mostrou que 62% dos genes voltavam ao normal após 24 horas e o restante apresentava níveis intermediários de expressão. “Uma hipótese que levantamos a partir daí é que pode haver necessidade de mais tempo para a recuperação total, já que, quando o animal é submetido à eutanásia para fazer a análise, o que se tem é um retrato da expressão dos genes naquele momento”, disse Camila.
Para manter os animais privados do sono REM, segundo a pesquisadora, o método consiste em mantê-los em uma pequena plataforma onde precisam se equilibrar para não cair em um recipiente com água. Na fase REM do sono, explicou, os animais entram em atonia muscular – isto é, não se sustentam em seus músculos – e caem na água.
Esse tipo de modelo experimental foi aplicado a humanos também, segundo Camila. “Temos estudos nos quais monitoramos, por polissonografia, pessoas privadas do sono REM durante 96 horas. Também estudamos pessoas sob privação total de sono durante 48 horas.”
Olhando a expressão gênica de maneira global, o novo trabalho mostrou que as alterações verificadas nos animais após a privação de sono REM têm uma base molecular no cérebro. Com isso, os dados obtidos forneceram um conjunto de transcritos que podem estar relacionados à regulação do sono REM e à base biológica de distúrbios do sono.
“A partir de agora vamos estudar as alterações em outras áreas do cérebro além do córtex. O ponto principal é que mostramos que o método é eficaz para inserir a parte molecular em todos os outros modelos, possibilitando uma visão mais detalhada e basal”, disse.
O artigo To what extent is sleep rebound effective in reversing the effects of paradoxical sleep deprivation on gene expression in the brain?, de Camila Guindalini e outros, pode ser lido em www.sono.org.br
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